terça-feira, 18 de novembro de 2008

A IMPRENSA NÃO AGE SOZINHA

    Princesas não morrem. Ao contrário: são felizes para sempre. Isso explica grande parte da comoção provocada pela morte absurda de Lady Di. Eu mesma, que já havia criticado seu comportamento semi-retardado durante a célebre entrevista para a BBC, fiquei sensibilizada. Ao recuperar a solteirice, a ex-futura rainha da Inglaterra parecia ter voltado a ser simplesmente Diana Spencer, uma mulher madura, bonita e livre, que respondia pelos seus atos em vez de continuar fazendo o papel de vítima da família Real. Diana estava renascendo, mas se foi, num parto prematuro.  

 É fácil prever que a imprensa não sairá ilesa do acidente, já que foi confirmado que alguns paparazzi seguiam o carro da princesa no momento da tragédia. Segundo muitos, quem matou Diana não foi o acelerador, mas as lentes dos fotógrafos. 

  Deve ser mesmo um inferno essa perseguição implacável, essa falta de privacidade que impede celebridades de terem uma vida normal. Diana não podia abrir uma janela sem que houvessem dezenas de teleobjetivas apontadas em sua direção. Sua rotina era uma verdadeira prisão de segurança máxima. Mas os jornalistas sensacionalistas não merecem levar a culpa inteira. Também temos algo a ver com isso.

   Nada mais emocionante do que a vida dos outros, ou você lê a revista Caras pelo seu texto erudito? "Os outros" são ricos. "Os outros" são lindos. "Os outros" têm amantes, segredos, histórias para contar. Até a casa do vizinho, vista de fora, parece mais aconchegante que a nossa. Viver a própria vida é entediante. A dos "outros" é que merece foco, e as vendas de lunetas vão muito bem, obrigada. 

  Enquanto houver mercado para a bisbilhotice, haverão paparazzi. Uns mais discretos, outros mais atrevidos, mas todos de plantão. Podemos chamá-los de urubus, só não sejamos cínicos: o boicote às fotos de Diana acidentada dentro do carro é o mínimo que se espera, mas quantos leitores boicotariam um jornal que as publicasse?

   Diana, sem querer, foi a vítima perfeita. Era loira, linda e aristocrática, o que não combina com vida mundana. E foi também adúltera, divorciada e roqueira, o que não combina com contos de fadas. Era uma princesa moderna, uma plebéia coroada, uma contradição fascinante. Tímida e forte, coadjuvante e estrela, tudo ao mesmo tempo. Mais do que uma mulher, um ícone. E quem a consumia éramos nós, que fazíamos triplicar a tiragem das revistas cada vez que ela aparecia na capa. Sem Diana, é como se tivéssemos que aprender a viver sem Coca-Cola. 

  Toda celebridade é um produto de consumo, não importa o valor de seu trabalho. John-John Kennedy, Madonna, Michael Jackson, o Papa, todos eles estão expostos na vitrine da mídia. Fatura-se em cima de suas imagens, e eles faturam também, se não em espécie, em poder. Lady Di morreu precocemente porque o motorista da Mercedes estava a 160km por hora numa via pública. Se fez isso por conta própria ou se estava obedecendo ordens, ninguém sabe. Os paparazzi foram cúmplices? Talvez, mas nosso voyerismo também não sai dessa inocente.

***Martha Medeiros***